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quinta-feira, 8 de março de 2012

sensibilidade ....LUIS VAZ DE CAMOES

"Que dias há que n'alma me tem posto
um não sei quê , que nasce não sei onde,
vem  não sei como, e dói  não sei  porquê."









Quem diz que Amor é falso ou enganoso,
ligeiro, ingrato, vão, desconhecido,
sem falta lhe terá bem merecido
que lhe seja cruel ou rigoroso.

Amor é brando, é doce e é piadoso.
Quem o contrário diz não seja crido;
seja por cego e apaixonado tido,
e aos homens, e inda aos deuses, odioso.

Se males faz Amor, em mi se vêem;
em mi mostrando todo o seu rigor,
ao mundo quis mostrar quanto podia.

Mas todas suas iras são de amor;
todos estes seus males são um bem,
que eu por todo outro bem não trocaria.






Transforma-se o amador na cousa amada,
por virtude do muito imaginar;
não tenho, logo, mais que desejar,
pois em mim tenho a parte desejada.

Se nela está minha alma transformada,
que mais deseja o corpo de alcançar?
Em si somente pode descansar,
pois consigo tal alma está ligada.

Mas esta linda e pura semidéia,
que, como um acidente em seu sujeito,
assim como a alma minha se conforma,

está no pensamento como idéia:
[e] o vivo e puro amor de que sou feito,
como a matéria simples busca a forma.





Que Amor Fez sem Remédio, o Tempo, os Fados?

Depois de tantos dias mal gastados,
Depois de tantas noites mal dormidas,
Depois de tantas lágrimas vertidas,
Tantos suspiros vãos vãmente dados,

Como não sois vós já desenganados,
Desejos, que de cousas esquecidas
Quereis remediar mortais feridas,
Que amor fez sem remédio, o tempo, os Fados?

Se não tivéreis já longa exp'riência
Das sem-razões de Amor a quem servistes,
Fraqueza fora em vós a resistência.

Mas pois por vosso mal seus males vistes,
Que o tempo não curou, nem larga ausência,
Qual bem dele esperais, desejos tristes?


Luís Vaz de Camoes











Ditoso seja aquele que somente

Ditoso seja aquele que somente
Se queixa de amorosas esquivanças;
Pois por elas não perde as esperanças
De poder nalgum tempo ser contente.

Ditoso seja quem, estando absente,
Não sente mais que a pena das lembranças,
Porque, inda mais que se tema de mudanças,
Menos se teme a dor quando se sente.

Ditoso seja, enfim, qualquer estado,
Onde enganos, desprezos e isenção
Trazem o coração atormentado.

Mas triste de quem se sente magoado
De erros em que não pode haver perdão,
Sem ficar na alma a mágoa do pecado.










O fogo que na branda cera ardia

O fogo que na branda cera ardia,
Vendo o rosto gentil que na alma vejo.
Se acendeu de outro fogo do desejo,
Por alcançar a luz que vence o dia.

Como de dois ardores se incendia,
Da grande impaciência fez despejo,
E, remetendo com furor sobejo,
Vos foi beijar na parte onde se via.

Ditosa aquela flama, que se atreve
Apagar seus ardores e tormentos
Na vista do que o mundo tremer deve!

Namoram-se, Senhora, os Elementos
De vós, e queima o fogo aquela nave
Que queima corações e pensamentos.






2 comentários:

  1. De tudo ficaram três coisas...
    A certeza de que estamos começando...
    A certeza de que é preciso continuar...
    A certeza de que podemos ser interrompidos
    antes de terminar...
    Façamos da interrupção um caminho novo...
    Da queda, um passo de dança...
    Do medo, uma escada...
    Do sonho, uma ponte...
    Da procura, um encontro!

    Fernando Sabino

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  2. SONETO LXXXVIII
    Quando me tratas mau e, desprezado,
    Sinto que o meu valor vês com desdém,
    Lutando contra mim, fico a teu lado
    E, inda perjuro, provo que és um bem.
    Conhecendo melhor meus próprios erros,
    A te apoiar te ponho a par da história
    De ocultas faltas, onde estou enfermo;
    Então, ao me perder, tens toda a glória.
    Mas lucro também tiro desse ofício:
    Curvando sobre ti amor tamanho,
    Mal que me faço me traz benefício,
    Pois o que ganhas duas vezes ganho.
    Assim é o meu amor e a ti o reporto:
    Por ti todas as culpas eu suporto.

    William Shakespeare

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